DIA INTERNACINAL DA ÁGUA


A importância da água e sua utilização em ranários comerciais    Água é vida! E como muitos já sabem ou, então, já ouviram falar, o Planeta Terra deveria chamar-se  "Planeta Água". Isto porque cerca de ¾ da superfície terrestre são recobertos por água. Entretanto, desses ¾, 97,25% são recobertos por água salgada e somente 2,75%, por água continental. Do total da água continental, 68,9% estão concentrados nas calotas polares, restando apenas 31,1% para utilização imediata.A água é um recurso vital para a sobrevivência dos seres. Ela representa um elo de ligação entre todos os ecossistemas do planeta. Caindo em forma de chuva, é um excepcional solvente, que carrega os nutrientes essenciais à vida. Mais de 70% do corpo humano é feito de água. Além disso, é utilizada em atividades domésticas; industriais; recreação; agricultura, pecuária; comércio; navegação; aqüicultura, geração de força motriz e energia; saúde e lazer. Dada a importância deste recurso e sua crescente deterioração ao longo dos últimos anos, a ONU (Organização das Nações Unidas) decretou que o ano de 2003 seria o "Ano Internacional da Água Doce". A principal intenção deste órgão foi de fomentar, entre os mais distintos níveis da sociedade (governamental, empresarial, produtivo), uma ampla discussão sobre este tema. Segundo a ONU, está prevista para o ano de 2025 a "Crise da Água", ocasião em que aproximadamente 5 bilhões de pessoas terão dificuldades para satisfazer suas necessidades de água, e a metade delas enfrentará uma extrema escassez, se não houver uma mudança nos padrões de consumo, uso e conservação dos mananciais. É por estas e outras razões que se torna imprescindível, para as diferentes atividades dentro da aqüicultura, dar a devida importância à principal fonte de recurso e sucesso do empreendimento: a água.O Brasil possui um dos maiores potenciais de água continental, distribuídos em uma das mais extensas e densas redes hidrográficas do mundo. Este grande potencial de água continental – superficial e subterrânea – deve ser visto como um capital ecológico de inestimável importância e como fator competitivo fundamental para o desenvolvimento sócioeconômico sustentado. Em contrapartida, a água é o meio pelo qual doenças podem se alastrar com grande velocidade e freqüência,  fazendo-se necessário controlar ou atenuar a poluição aquática e suas implicações biológicas, que representam séria ameaça à saúde pública.Muitas vezes, a criação de organismos aquáticos pode ser conflitante com outros segmentos agropecuários. A agricultura intensiva geralmente lança mão de produtos químicos e orgânicos para incrementar a sua produtividade e defender as culturas de possíveis ataques de pragas. Estes xenobióticos entram no ambiente aquático através de aplicações na lavoura, sendo disseminados pela ação de chuvas e ventos, contaminando rios, lagos e lençóis freáticos. No caso das águas subterrâneas, a contaminação compromete seu uso, o que se torna mais grave considerando que tais águas tendem a ser  utilizadas com mais freqüência para o consumo humano, em razão da piora da boa qualidade das águas de superfície (rios e lagos). Os organismos aquáticos são sensíveis à ação tóxica de pequenas quantidades de substâncias químicas, podendo morrer ou envenenar-se em conseqüência direta da presença dessas substâncias na água, como, por exemplo, cobre e zinco. Milhares de organismos aquáticos são mortos, periodicamente, em nossos rios, devido à aplicação de substâncias, como o sulfato de cobre e/ou compostos à base de cobre e zinco, no combate a fungos que constituem pragas da lavoura. Essas substâncias são depois arrastadas pelas águas das chuvas para os rios, onde concentrações da ordem de 0,5 mg/L já podem provocar grandes mortalidades de peixes. Nos ambientes aquáticos, a absorção das substâncias tóxicas por algas leva, através da cadeia alimentar, ao aumento das concentrações nos organismos a cada degrau dessa cadeia. Este processo é conhecido como biomagnificação.      

As significações simbólicas da água podem reduzir-se a três temas dominantes: fonte de vida, meio de purificação, centro de regenerescência. Esses três temas se encontram nas mais antigas tradições e formam as mais variadas combinações imaginárias – e as mais coerentes também.

As águas, massa indiferenciada, representando a infinidade dos possíveis, contêm todo o virtual, todo o informal, o germe dos germes, todas as promessas de desenvolvimento, mas também todas as ameaças de reabsorção. Mergulhar nas águas, para delas sair sem se dissolver totalmente, salvo por uma morte simbólica, é retornar às origens, carregar-se de novo num imenso reservatório de energia e nele beber uma força nova: fase passageira de regressão e desintegração, condicionando uma fase progressiva de reintegração e regenerescência (v.; banho*, batismo*, iniciação*).

 

O Rig Veda exalta as águas que trazem vida, força e pureza, tanto no plano espiritual quanto no corporal:

Vós, as águas, que reconfortais, trazei-nos a força, a grandeza, a alegria, a visão! … Soberanas das maravilhas, regentes dos povos, as Águas! … Vós, as Águas, dai sua plenitude ao remédio, a fim de que ele seja uma couraça para o meu corpo, e que assim eu veja por muito tempo o sol!  … Vós, as Águas, levai daqui esta coisa, este pecado, qualquer que ele seja, que cometi, esse malfeito que fiz, a quem quer que seja, essa jura mentirosa que jurei.

(Da trad. Francesa de Jean Varenne, VEDV 137.) 

As variações das diferentes culturas sobre os temas essenciais nos ajudarão a melhor apreender e aprofundar, sobre um fundo quase idêntico, as dimensões e os matizes dessa simbologia da água.

 

Na Ásia, a água é a forma substancial da manifestação, a origem da vida e o elemento da regeneração corporal e espiritual, o símbolo da fertilidade, da pureza, da sabedoria, da graça e da virtude. Fluida, sua tendência é a dissolução; mas, homogênea também, ela é igualmente o símbolo da coesão, da coagulação. Como tal, poderia corresponder à sattva; mas, como escorre para baixo, para o abismo, sua tendência é tamas; como se estende na horizontal, sua tendência é ainda rajas.

 

A água é a matéria-prima, a Prakriti: Tudo era água dizem os textos híndus; as vastas águas não tinham margens, diz um texto taoísta. Bramanda, o Ovo do mundo, é chocado à superfície das Águas. Da mesma forma, o Sopro ou Espírito de Deus, no Gênesis, pairava sobre as águas. A água é Wu-ki, dizem os chineses, o Sem-Crista, o caos, a indistinção primeira. As Águas, representando a totalidade das  possibilidades de manifestação, se dividem em Águas superiores, que correspondem às possibilidades informais (indeterminadas); e Águas inferiores, que correspondem às possibilidades formais (determinadas). Dualidade que o Livro de Enoch traduzirá em termos de oposição sexual, e que a iconografia representa freqüentemente pela dupla espiral. As águas inferiores estão, ao que se diz, fechadas num templo de Lhassa, dedicado ao rei dos nagas. As possibilidades informais são representadas na Índia pelas Apsaras* (de Ap, água). A noção de águas primordiais, de oceano das origens, é quase universal. Pode ser encontrada até na Polinésia, e a maior parte dos povos austro-asiáticos situa na água o poder cósmico. A ela se junta muitas vezes o mito do animal mergulhador, como o javali hindu, que traz um pouco de terra à superfície, embrião que aflora à manifestação formal.

Origem e veículo de toda vida: a seiva é água, e em certas alegorias tântricas, a água representa prana, o sopro vital. No plano corporal, e por ser também um Dom do céu, ela é um símbolo universal de fertilidade e fecundidade. A água do céu faz o arrozal, dizem os montanheses do sul do Vietnã, sensíveis, também cumpre dizê-lo à função regeneradora da água, que consideram medicamento e poção de imortalidade.

 

Da mesma forma, a água é o instrumento da purificação ritual. Do Islã ao Japão, passando pelos ritos dos antigos fu-chuel taoístas (senhores da água benta), sem esquecer a aspersão dos cristãos, a ablução* tem papel essencial. Na índia e no Sudeste Asiático, a ablução das estátuas santas – e dos fiéis – (sobretudo no Ano-Bom) é, ao mesmo tempo, purificação e regeneração. A natureza da água leva-a à pureza, escreve Wan-tse. Ela é, ensina Lao-tse, o emblema da suprema Virtude (Tao,cap.8). É, ainda, o símbolo da sabedoria taoísta, porque não tem contestações. É livre e desimpedida, corre segundo o declive do terreno. É a medida, pois que o vinho forte demais deve ser misturado com água, mesmo em se tratando do vinho do conhecimento.

 

A água, oposta ao fogo, é yin. Corresponde ao norte, ao frio, ao solstício do inverno, aos rins, à cor negra, ao trigrama K'an, que é o abissal. Mas, de outro modo, a água está ligada ao raio, que é fogo. Ora, se a redução à Água dos alquimistas chineses pode ser muito bem considerada como uma volta ao começo, ao estado embrionário, diz-se também que essa água é fogo, e que as abluções herméticas devem ser entendidas como purificações pelo fogo. Na alquimia interna dos chineses, o banho e a lavagem poderiam bem ser operações de natureza ígnea. O mercúrio alquímico, que é água, é às vezes qualificado como água ígnea.

Observemos, ainda, que a água ritual das iniciações tibetanas é o símbolo de votos, dos compromissos assumidos pelo postulante.

 Para voltar, enfim, ao simples encanto das aparências, citemos a bela fórmula de Victor Segalen: Meu amante tem as virtudes da água: um sorriso claro, gestos fluidos, uma voz pura que canta gota a gota (Stèles). (BENA, CORT, DAMS, DAVL, PHIL, GOVM, GRIE, GRIF, HUMU, JILH, LIOT, MUTT, SAIR, SCHG, SOUN). 

É sob forma simbólica que se exprime ainda uma prece védica às Águas, prece que cumpre entender como relativa a todos os níveis de existência, física e mental, que as Águas são capazes de vivificar:

 Ò ricas Águas, pois que reinas sobre a opulência, e alimentais a boa vontade e a imortalidade, e sois as soberanas da riqueza que se faz acompanhar de uma boa prosperidade, dignai-vos. Sarasvati, dotar de um vigor juvenil aquele que canta. (Asvalayana Strantasutra, 4, 13. VEDV 270). 

Nas tradições judaica e cristã, a água simboliza, em primeiro lugar, a origem da criação. O mem (M) hebraico simboliza a água sensível: ela é mãe e matriz (útero). Fonte de todas as coisas, manifesta o transcendente e deve ser, em conseqüência, considerada como uma hierofania.

 

Todavia, a água, como, aliás, todos os símbolos, pode ser encarada em dois planos rigorosamente opostos, embora de nenhum modo irredutíveis, e essa ambivalência se situa em todos os níveis. A água é fonte de vida e fonte de morte, criadora e destruidora.

 

Na Bíblia, os poços* no deserto, as fontes* que se oferecem aos nômades são outros tantos lugares de alegria e encantamento. Junto das fontes e dos poços operam-se os encontros essenciais. Como lugares sagrados, os pontos de água têm papel incomparável. Perto deles, nasce o amor e os casamentos principiam. A marcha dos hebreus e a caminhada de todo homem na sua peregrinação terrena estão intimamente ligadas ao contato exterior ou interior com a água. Esta se torna, então, um centro de paz e de luz, oásis.

A Palestina é uma terra de torrentes e de fontes. Jerusalém é regada pelas águas tranqüilas de Siloé. Os rios* são agentes de fertilização de origem divina, as chuvas* e o orvalho trazem consigo a fecundação e manifestam a benevolência divina. Sem água, o nômade seria imediatamente condenado à morte e crestado pelo sol da Palestina. Assim, a água que ele encontra no caminho é comparável ao maná celeste: desalterando-o, ela o alimenta. É por isso que se reza pedindo água, pois é ela objeto de súplica. Que Deus escute o grito do seu servo, que lhe envie os seus aguaceiros, que faça encontrar os poços e as fontes. A hospitalidade exige que se apresente água fresca ao visitante, que seus pés sejam lavados, a fim de assegurar a paz do seu repouso. Todo o Antigo Testamento celebra a magnificência da água. O Novo receberá esse legado e saberá utilizá-lo.

 

Jeová é comparado a uma chuva de primavera (Oséias, 6, 3), ao orvalho que faz crescer as flores (id., 14, 6), às águas frescas que descem das montanhas, à torrente que sacia. O justo é como a árvore plantada à beira de águas correntes (Números, 24, 6). A água aparece, então, como um sinal de bênção. Mas convém reconhecer nela justamente a origem divina. Assim, e segundo (Jeremias, 2, 13), o povo de Israel, na sua infidelidade, desprezando Jeová, esquecendo suas promessas e deixando de considerá-lo como a fonte de água viva, quis cavar suas próprias cisternas. Estas, porém, gretadas, não conservavam a água. Jeremias, verberando a atitude do povo em face de Deus, fonte de água viva, lamenta-se dizendo: Eles farão do seu próprio país um deserto (18, 16). As alianças estrangeiras são comparadas às águas do Nilo e do Eufrates (11, 18). A alma busca seu Deus como o cervo sedento busca a presença da água viva (Salmos, 42, 2-3). A alma aparece, assim, como terra seca e sedenta, orientada para a água. Espera a manifestação de Deus como a terra ressecada anseia pelas chuvas que deverão encharcá-la (Deuteronômio, 32, 2). É esse simbolismo, que provém das bases mais antigas do mundo mediterrâneo, que fornecerá ao poeta Federico García Lorca a trama de sua tragédia Yerma, a mulher estéril por falta de homem, como estéril (yermo) é o  deserto, por falta de chuva.

 

É muito natural que os orientais tenham visto, assim, a água, primeiro como um sinal e um símbolo de bênção: pois não é ela que permite a vida? Quando Isaías profetiza uma era nova, diz: brotará água no deserto… o país da sede se abrirá em fontes... (35, 607). O vidente do Apocalipse não fala outra linguagem: O Cordeiro… os conduzirá às fontes das águas da vida (Apocalipse, 7, 17).

 

A água é dada por Jeová à terra, mas trata-se de uma outra água, mais misteriosa: provém da Sabedoria, que presidiu, no momento da criação, à formação das águas (Jó, 28, 25-26; Provérbios, 3, 20; 8, 22, 24, 28-29; Eclesiástico, 1,2-4). No coração do sábio reside a água; ele é semelhante a um poço e a uma fonte (Provérbios, 20, 5; Eclesiástico, 21, 13), e suas palavras têm a potência da torrente (Provérbios, 18, 4). Quanto ao homem privado de sabedoria, seu coração é comparável a um vaso rachado que deixa escapar o conhecimento (Eclesiástico, 21, 14). Ben Sira compara a Torá (torah: a lei mosaica) à Sabedoria, pois a Torá esparge uma água de Sabedoria. Os Padres da Igreja consideram o Espírito Santo como autor do dom de sabedoria, que dispensa aos corações sequiosos. As teologias da Idade Média apresentam esse tema dando-lhe sentido idêntico. Assim, para Hugues de Saint-Victor, a Sabedoria possui suas águas, a alma é lavada pelas águas da sabedoria.

 

A água se torna o símbolo da vida espiritual e do Espírito, oferecidos por Deus e muitas vezes recusados pelos homens.

 

Jesus retoma esse simbolismo no seu diálogo com a samaritana: Aquele que beber da água que eu lhe darei não terá mais sede… A água que eu lhe darei se tornará nele fonte de água a jorrar em vida eterna (João, 4, especialmente versículo 4).

 

Símbolo, antes de tudo, de vida no antigo Testamento, a água se tornou, no Novo, símbolo do Espirito (Apocalipse, 21).

 

Jesus Cristo se revela Senhor da água viva à samaritana (João,4, 10). Ele é a fonte: Se alguém tiver sede, que venha a mim e se desaltere (id., 7,37-38). Como do rochedo de Moisés, a água jorra do seu seio e, na cruz, a lança fará correr sangue e água do seu flanco aberto. É do Pai que flui a água viva, comunica-se pela humanidade do Cristo ou, ainda, pelo dom do Espírito Santo, que, conforme o texto de um hino de Pentecostes, é fons vivus (manancial de água viva), ignis caritas (fogo de amor), Altissimi donum Dei (Dom do Altíssimo). São Atanásio explica o sentido dessa doutrina, dizendo: O Pai sendo a fonte, o Filho é denominado de rio, e diz-se que nós bebemos o Espírito (Ad Serapionem, 1, 19). A água se reveste, então, de um sentido de eternidade. Aquele que bebe dessa água viva participa antecipadamente da vida eterna (João 4, 13-14).

 

A água viva, a água da vida se apresenta como um símbolo cosmogônico. E porque ela cura, purifica e rejuvenesce, conduz ao eterno. Segundo Gregório de Nissa, os poços conservam uma água estagnada. Mas o poço do Esposo é um poço de águas vivas. Ele tem a profundeza da cisterna e a mobilidade do rio, o que não deixa de ter relação com o texto de Lorca citado acima.

 

Segundo Tertuliano, o Espírito Divino escolheu a água entre os diversos elementos. É para ela que se voltam as suas preferências, pois ela se mostra, desde a origem, como matéria perfeita, fecunda e singela, totalmente transparente (De baptismo, 3). Possui, por si mesma, uma virtude purificadora e, por mais esse motivo, é considerada sagrada. Donde seu uso nas abluções rituais. Por sua virtude, a água apaga todas as infrações e toda mácula. A água do batismo, e só ela, lava os pecados, e só é conferida uma vez porque faz aceder a um outro estado: o do homem novo. Essa rejeição do homem velho, ou melhor, essa morte de um momento da história, é comparável a um dilúvio*, porque este simboliza uma desaparição, uma destruição: uma era se aniquila, outra surge.

 

A água, possuidora de uma virtude lustral, exercerá ademais um poder soteriológico. A imersão nela é regeneradora, opera um renascimento, no sentido já mencionado, por ser ela, ao mesmo tempo, morte e vida. A água apaga a história, pois restabelece o ser num estado novo. A imersão é comparável à deposição do Cristo no santo sepulcro: ele ressuscita, depois dessa descida nas entranhas da terra. A água é símbolo de regeneração: a água batismal conduz explicitamente a um novo nascimento (João, 3,307), é iniciadora. O pastor de Hermas fala daqueles que desceram à água mortos e dela subiram vivos. É o simbolismo da água viva, da fonte de juventa. O que tenho em mim, diz Inácio de Teóforo (segundo Calisto), é a água que opera e fala. Sabe-se que a água da fonte de Castália, em Delfos, inspirava a Pítia. A água da vida é a Graça divina.

Os cultos são deliberadamente concentrados em torno das nascentes de água. Todo lugar de peregrinação comporta seu olho d'água, sua fonte. A água pode curar em razão das suas virtudes específicas. No curso dos séculos, a Igreja se levantou muitas vezes contra o culto prestado às águas. A devoção popular considerou sempre o valor sagrado e sacralizante das águas. Mas os desvios pagãos e a volta das superstições constituíam, sempre uma ameaça. A magia espreita o sagrado para pervertê-lo na imaginação dos homens.

 

Se as águas precedem a criação, é evidente que elas continuam presentes para a recriação. Ao homem novo corresponde a aparição de um outro mundo.

Em certos casos, e já o dissemos no começo deste verbete, a água pode fazer obra de morte. As grandes águas anunciam, na Bíblia, as provações. O desencadeamento das águas é o símbolo das grandes calamidades.

 

… Certeiras, surgirão rajadas de raios, do teso arco das nuvens para o alvo voarão; sua funda lançará furiosa saraivada, contra eles lufarão as ondas do mar, sem piedade os rios os afogarão. Um sopro poderoso se levantará contra eles e os dispersará qual furacão.(Sabedoria, 5, 21-23).

 

A água pode destruir e engolir, as borrascas destroem as vinhas em flor. Assim, a água também comporta um poder maléfico. Nesse caso, ela pune os pecadores, mas não atinge os justos: estes nada têm a temer das grandes águas. Às águas da morte concernem apenas os pecadores e se transformam em águas de vida para os justos. Como o fogo, a água pode servir de ordálio. Os objetos nela lançados se julgam, a água não profere sentença.

 

Símbolo da dualidade do alto e do baixo: água de chuva – água do mar. A primeira é pura; a segunda, salgada. Símbolo de vida: pura, ela é criadora e purificadora (Ezequiel, 36, 25); amarga, ela produz e maldição (Números, 5, 18). Os rios podem ser correntes benéficas ou dar abrigo a monstros. As águas agitadas significam o mal, a desordem.

 

Os maus são comprados ao mar agitado… (Isaias, 57, 20). Salva-me Ó Deus, pois a água/está subindo ao meu pescoço./Estou afundando num lodo profundo, sem nada que me afirme … (Salmos, 69, 1-2).

 

As águas calmas significam a paz e a ordem (Salmos, 23, 2). No folclore judaico, a separação feita por Deus, quando da criação das águas superiores e inferiores, designa a partilha das águas masculinas e femininas, simbolizando a segurança e a insegurança, o masculino e o feminino, o que se liga, como já foi dito, a um simbolismo universal .

 

As águas amargas do oceano designam a amargura do coração. O homem – dirá Richard de Saint-Victor – deve passar pelas águas amargas quando toma consciência da própria miséria, essa santa amargura se transmudará em júbilo (De statu interioris hominis, 1, 10, P.L., 196, 124).

 

Nas tradições do Islã, a água simboliza também inúmeras realidades.

 

O Corão designa a água-benta que cai do céu como um dos signos divinos. Os Jardins* do Paraíso têm arroios de águas vivas e fontes (Corão, 2,25;88,12; etc). O próprio homem foi criado de uma água que se difundiu (Corão, 86, 6).

 

Deus! Foi Ele quem criou o céu e a terra, e que fez descer do céu uma água graças à qual faz brotarem os frutos para a vossa subsistência. (Corão, 14,32; 2, 164).

 

As obras dos incréus são consideradas como água por aquele que tem sede; mas isso não passa de miragem. Elas se parecem às águas tenebrosas de um mar profundo, que vagas sucessivas vêm cobrir (Corão, 24, 39-40). A vida presente é comparada à água que o vento dispersa (Corão, 18, 45).